Novos velhos amigos

Engraçado como a inspiração bate quando a gente tem coisa pra fazer, né. E hoje, o que eu tenho pra fazer é coisa boa, é ajudar uma amiga revisando um texto dela (e ela ainda vai me pagar por isso). Mesmo assim, cheirou à obrigação, a gente se inspira pra escrever, compor e até limpar o quarto. Milagres que o vício da procrastinação traz consigo.
O caso é que, pensando nessa amiga que vou ajudar, fiquei refletindo sobre todas as minhas amizades. E esse pensamento não é só de hoje; foi vindo com pequenos momentos cotidianos que foram despertando em mim uma mistura de saudade e nostalgia ingrata.
Ontem, por exemplo, fui criar um grupo de amigo secreto virtual para minha recente turma de amigos aqui de Lisboa, onde estou morando. Eu  já tinha uma conta no site que faz o sorteio, mas não lembrava a senha. Mandei-a para o meu e-mail, e a lembrança apertou o peito: era uma senha relacionada aos meus amigos que participaram do último amigo secreto que fiz por esse site, amigos que hoje parecem estar muito mais separados que juntos (e isso não tem absolutamente nada a ver com a minha estadia em Lisboa).
A saudade machucou muito, principalmente porque esses não eram quaisquer amigos. Eram aqueles que eu apontei e disse "PRA SEMPRE!". São aqueles pra quem eu quero voltar, dentre outras pessoas, no final deste intercâmbio. Eles estavam do meu lado em momentos horrorosos da vida, e em outros maravilhosos, e me ajudaram a construir o meu caráter na adolescência, a fase mais doce e difícil de todas.
Porém, os tempos mudam... E como isso é a mais pura e violenta verdade! Eu, que achava que ia passar - e, sobretudo, QUERER passar - todos os meus reveillóns, todos os meus aniversários, todos os meus momentos só com eles, me vejo hoje querendo voar longe e nem me preocupando muito com onde eles estão. Falta de amor? Falta de amizade? Não, acho que não... Acho que eu estou é aprendendo que, na vida, cada um tem seu lugar, e temos mesmo que encontrá-lo, mesmo que, para isso, tenhamos que rodar o mundo primeiro.
E, rodando o mundo, descobrimos muita coisa. Culturas novas, povos novos, lugares novos... Nada disso, porém, se compara à beleza de conhecer GENTE nova. Eu confesso que fico um pouco frustrada mas um pouco orgulhosa de me relacionar mais com brasileiros do que com portugueses ou pessoas de qualquer outra nacionalidade; frustrada porque esperava um intercâmbio SÓ com gringos e aquele sonho europeu de uma adolescente fanática pela Inglaterra; orgulhosa porque reconheci que não há  gente como a gente brasileira! Não há povo mais alegre, solidário e disposto a caminhar junto, se unir mesmo, como o brasileiro. E, nessas indas e vindas, fiz amigos de todos os estados do Brasil (até do Acre!), e com alguns deles resolvi fazer uma confraternização de fim de ano, um amigo secreto.
E aí penso: e meus amigos do Brasil? E a MINHA turma, em Caps Lock? Será que eles lembram que vai ser meu aniversário logo depois do Natal? Claro, existe sempre aquela meia dúzia da qual a gente nunca duvida. Aqueles amigos que são muito mais pra irmãos, que fazem parte de nós já. Aquele amigo que te faz desviar do seu caminho porque viu algo bonito na rua que te fez lembrar dele. Mas e os outros?
E aqueles que, há alguns anos, me faziam rir tanto? Me compeendiam tanto? Dividiam comigo meus e seus problemas? O que acontece quando a gente percebe que nem faz mais tanta questão mesmo deles? Até porque, percebe que aquela amizade nem fazia tão bem assim?
É complicado. Dá raiva de si mesmo, dá raiva deles. Alguns nem perguntam pra saber se estamos vivos! Outros ainda vêm, timidamente, raramente, mas vêm. E eu fico pensando: eu sempre fui uma  ótima amiga! Eu sempre deixei de lado minha própria vida, minhas vontades, meus compromissos, para estar ao lado de um amigo, se fosse necessário! Se ele estivesse precisando! E nem precisava ser um amigo muito antigo. Hoje, por exemplo. Tenho meus próprios compromissos e minhas próprias tarefas, mas que me custa para um pouco e ajudar minha amiga com seu trabalho que precisa ser revisado,
se posso fazê-lo? Nada, realmente nada.
E aí vejo pessoas que poderiam ter feito isso por mim a vida inteira e nunca ligaram e outras que não precisavam ter feito nada por mim mas moveram céus e terras quando me viram  piscar com uma mínima possibilidade de uma leve tristeza e concluí: sou muito idiota.
Fiquei me prendendo a esse conceito ridículo de "MINHA turma", do mesmo jeito que, há algum tempo atrás, NÃO MUITO, me prendia ao conceito de "MEU namorado", de "MINHA vida", congelando, assim, qualquer outra possibilidade. Mas que coisa mais imbecil e moralista a se fazer! A gente é educado mesmo pra ser tradicional, e eu levei isso ao extremo... Esquecendo da necessidade e da maravilha da constante transformação, da possibilidade de crescer através do novo e das vantagens do desapego sem significar esquecimento! Claro, eu não preciso estar perto de alguém para amá-lo, nem tampouco preso psicologicamente. Eu  posso sim ser livre para passar a virada de ano onde eu quiser, se isso me fizer sentir coisas melhores. Principalmente se eu for lembrar que, no último ano novo juntos, MEUS queridos amigos riram de mim e das meninas do grupo porque queríamos usar óculos e tiaras coloridinhas, pra brincar na virada de ano.
Riram. De nós.  Porque queríamos ser mais felizes. Com ELES.  Inadmissível. Mesmo assim, são meus amigos e continuarão sendo, mas isso não significa que eu tenho que escolher sempre estar com eles. Principalmente se, nessa jornada do desbravamento, eu conseguir encontrar mais gente mais diferente.

Gente que ia amar aquela tiarinha. Talvez eu compre alguma para dar de presente nesse amigo secreto.

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